Sobre a criatividade de morar no mato
e a aranha que vive no teto do meu banheiro e outras histórias fantásticas
Não podemos negar a existência de um êxodo urbano considerável - não que a maioria esteja de fato, saindo dos grandes centros urbanos para morar no mato - mas vemos uma vontade e um desejo latente da realização deste movimento por algumas pessoas, junto a uma discussão sobre o tema que permeia as notícias do mundo e porquê não dizer também, das redes sociais.
Oi, eu sou a Milena, e faz 1 ano e 3 meses que eu me mudei para o meio do mato.
Não é um mato assim, tão distante da metrópole; estou apenas a 45 min da cidade de Curitiba, mas longe o suficiente para acordar com barulho de tucanos e dormir com o som das cigarras. Quero exprimir nesse texto, pontualmente, sobre o valor que o convívio diário com a natureza e com os animais tem pra mim, seja quais estes forem.
A casa que moro é pequena, de madeira, praticamente um chalé, um abrigo perto das montanhas. E o que mais amo de morar aqui, certamente, é a presença de animais dentro de casa.
Decidi explorar o tema nesse texto quando, esses dias, enquanto tomava meu banho diário de chuveiro (geralmente é no banho que relaxo e posso ter umas ideias bacanudas), vi, logo acima da minha cabeça, uma aranha construindo sua teia, bem no teto do meu banheiro. Fiquei analisando a sensação boa que aquilo ali me dava; estava convivendo em comunhão com a natureza e seus animais. Talvez qualquer outro ser humano já teria pego uma vassoura para destruir o árduo trabalho daquela aranha, mas eu, eu não; estava ali admirando, curtindo aquele momento como alguém que admira uma bela paisagem. Desde pequena sou assim, conectada com a natureza e com o natural, ao ponto de saber que até causo uma certa estranheza socialmente falando, quando abordo essa temática, pois sei profundamente, que meu pensamento sobre o tema é diferente, é minoria. Geralmente conecto e faço relações, pois se uma aranha está ali, morando no teto do meu banheiro, isso é um bom sinal, pois quer dizer que ela está pegando e matando os mosquitos, sem que eu tenha que fazer este trabalho por ela. Na natureza tudo se conecta, um ser é dependente do outro, é uma cadeia de relações, de ciclos, e eu aprendo demais observando e principalmente, respeitando este meio.
Faz um tempo que tenho tido o interesse genuíno por biomimética, uma área da ciência que estuda os princípios criativos, estratégias e elementos da natureza, visando a criação de soluções inovadoras para os problemas atuais da humanidade, unindo funcionalidade, estética e sustentabilidade. Estudos biomiméticos pertencem a uma área altamente multidisciplinar, encapsulando diversos ramos da ciência. Áreas como design, biologia, química, física, tecnologia e matemática são temas geralmente abordados. Portanto, a biomimética procura aprender com a natureza, suas estratégias e soluções, e utiliza esse conhecimento em diferentes domínios da ciência. A designação desta recente e promissora área de estudo científico provém da combinação das palavras gregas bíos, que significa vida e mímesis que significa imitação. Dito de modo simples, a biomimética é a imitação da vida.
E o que seria a natureza, senão a vida acontecendo, em sua mais crua forma?
Isso me inspira demais, é um tema que me empolga a viver diferente e pensar fora da caixa, e se torna uma ferramenta essencial para a construção da minha vida como artista, sempre em busca de inovação e transformação.
Mas voltando para a aranha, a teia de aranha é um exemplo de inspiração para a biomimética, sendo utilizada na criação de vidros e shampoos. A empresa alemã Arnold Glass criou vidros que refletem a luz ultravioleta (UV) a partir da análise da composição das teias de aranha, e a Natura utilizou a biomimética para reproduzir uma proteína encontrada nas teias de aranha em uma linha de shampoos. Isso não é incrível?
Esses dias estava já deitada na cama, me preparando para dormir com a minha filha, estávamos conversando sobre qualquer coisa interessante que tinha acontecido naquele dia. Assim que apaguei a luz, fomos surpreendidas por uma pequena luz piscando no quarto, um tanto poética; parecia uma estrela que se movia em um céu noturno, e aquilo me trouxe uma paz, algo de lúdico e brincante, tinha algo de vivaz. Por fim, adormeci tranquilamente com um vagalume dançando pelo meu quarto. Depois pesquisando, no outro dia, descobri que uma equipe de cientistas sul-coreanos se inspirou em lanternas de vagalume, através da biomimética, e conseguiu tornar LEDs mais brilhantes, criando uma nova tecnologia que reduz o gasto da energia elétrica. A magia da natureza sempre me surpreende, e minha intenção com esse texto é aproximar você dessa sabedoria intrínseca que nos permeia, e tentar te convencer a não matar mais qualquer inseto ou pequeno ser vivo que cruza o seu caminho, principalmente se você tem vontade de morar no meio do mato (ou pior ainda, já mora, mas não respeita esse ambiente natural). Vamos refletir sobre essas relações? Afinal, de que adianta se mudar pro meio do mato e não saber conviver nesse ambiente, que se difere muito do artificial.
Por vezes sinto uma profunda tristeza, ao ver o quanto as pessoas estão desconectadas e distantes do mundo natural, ao ponto de não saberem mais nem pertencer a esses lugares, enfim, longa discussão, não quero me prolongar agora porque acho que já consegui plantar uma semente em você nesse texto através da apresentação da biomimética, que era parte da minha intenção. Então vou cortar o assunto e compartilhar agora uma última experiência artística recente que tive ao me relacionar com a beleza da natureza, me inspirando na observação dela, para a criação de um poema.
Vi o céu cair,
enquanto gotas d´água,
dançavam em um pequeno lago.
Os patos se acocoravam em suas margens,
presentes,
silenciosos,
aguardando a chuva passar.
Pensei:
Eram estrelas piscando?
ou vagalumes cantando?
Ou era a presença da vida,
falando comigo baixinho,
através de pingos iluminados.
Eles diziam:
Hoje somos só um pinguinho,
Mas amanhã podemos ser poça, lago, rio, ou mar.
Um pingo de cada vez.
E ver sua luz a ofuscar,
O luar, enobrecer,
A noite chegar,
E o dia, entardecer.
Que delícia seu texto! Meu sonho sair da capital e morar num interior pequeno e cheio de natureza assim.
Um abraço!
É muito bom sair da cidade grande. Também fiz isso há 3 anos, saindo de São Paulo para o interior. Daqui, só para mais longe rs.